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07 dezembro 2012

A cortina de Brasília

Brasília estava bem ali na minha sala, com todos os seus monumentos, praças e palácios. Revelava-se em focos de luz destacados no pano azul-marinho, que pendia do varão junto ao teto e se estendia até o chão. Dependuradas na janela, as cenas mostravam uma Brasília distante e fantástica. Despertavam sensação semelhante à que era passada pelas fotos que registravam o homem pisando na Lua, destaque da revista Manchete colocada sobre a mesa de centro. O distanciamento imposto pelas estampas era o mesmo. Nove anos após ser inaugurada, a capital federal ainda era um sonho remoto sustentado pelas imagens que a eternizavam na cortina da sala. 
Impressionava-me com as esculturas de Bruno Giorgio flutuando em lagos tranquilos, com os palácios cheios de arcos, com a imensa Praça dos Três Poderes. Desejei conhecer todos aqueles monumentos. Se pudesse, entrava no pano e me integrava às imagens. Pensava que conhecer Brasília seria tão difícil como ver de perto a marca da bota de Neil Armstrong no solo lunar. 
Por isso mesmo conformei-me com as figuras carimbadas e com aquela cortina que não combinava com o resto do ambiente, mas deveria estar de acordo com a moda da época, deveria ser uma “cortina bossa-nova”, como o presidente que inaugurara a cidade das estampas. Lembrei-me da velha cortina muitos anos depois quando, ao abrir uma persiana na sala do meu apartamento, avistei uma das cenas do tecido em situação real. Fiquei pensando na relação de tempo e espaço que havia naquele encontro. O tempo passado e o tempo presente estavam misturados na mesma paisagem. A cortina que se balançava à frente dos meus olhos não cobria mais uma janela apenas, mas abria inúmeras passagens para a realidade que eu costumava frequentar no meu dia a dia. Eu, na verdade, agora fazia parte das estampas da antiga cortina e nem me dera conta deste fato até enxergar da janela cenas que desde a minha infância eram tão familiares. (2006)

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