O telefone toca no meio da noite.
Primeiro o toque se mistura a um sonho em andamento. Depois, o som se
sobressai no silêncio. Quem será a esta hora? E que horas serão? Levanto
correndo da cama enquanto acendo a luz do relógio na cabeceira. 2:38! Ai, quem
será? Misturam-se suposições desencontradas. Morreu alguém da família, pode ser
o vizinho do andar de cima reclamando de alguma coisa - afinal ele reclama de
tudo. Mas reclamar de quê no meio da noite?
Vou ao local onde fica o telefone - pelo menos deveria ficar -, mas ele
não estava na base. Mais uma vez os meninos usaram o telefone e deixaram em
outro lugar. E continua tocando. Tateando as paredes vou até à sala, pois era
de lá que vinha o som. E lá estava ele acendendo a luzinha vermelha e tocando
alto. Alô, digo logo ao atender. Do outro lado, uma voz masculina pergunta: É
você Lúcia? Por que demorou pra atender?
Tinha uma voz de bêbado o interlocutor. Começou a falar alto, brigando
com a coitada da Lúcia. Quando surgiu um intervalo também gritei: O senhor
ligou errado. Aqui não mora nenhuma Lúcia. Desliguei. Mas em seguida ele ligou
de novo. Não consegui entender como é que uma pessoa embriagada consegue discar
duas vezes o mesmo número errado. Vi então pelo visor do telefone a resposta para
a minha dúvida insignificante depois do susto no meio da noite. O número que
aparecia na Bina era de um celular. Ele discou errado uma vez e rediscou uma,
duas, três vezes. Na segunda vez já havia acordado o resto da família. O jeito
foi desligar o cabo do telefone.
Voltar a dormir? Tentei. Mas ainda estava com a adrenalina a mil. Já passava das 4 horas quando desisti de dormir e resolvi descrever esta minha
madrugada.